10.14.2009

Os significados do conceito de Alienação.

Prof.Ms.Ricardo George

O conceito de alienação em Marx deve ser entendido pelo menos em quatro dimensões, a saber:

I. O homem está alienado da natureza;
II. Está alienado de si mesmo (de sua própria atividade);
III. De seu “ser genérico” (de seu ser como membro da espécie humana);
IV. O homem está alienado do homem (dos outros homens)

O primeiro desses aspectos, que já foi por nós destacado em momentos anteriores, é a característica que se expressa na relação do trabalhador com seu produto, que na visão de Marx é a relação com o mundo sensível exterior com os objetos da natureza. A outra característica subseqüente é a expressão de trabalho, como o ato de produção no interior do processo deste trabalho, isto é, a relação do trabalho com sua própria atividade como alheia, que não oferece satisfação em si e por si mesma. Mas, apenas para atender o ato de vendê-la a outra pessoa. Assim, observamos que a sua satisfação encontra-se diluída na satisfação de quem consome o que produziu, isto é, a atividade do trabalho não lhe proporciona realização, tendo em vista que isto se cumpre apenas como uma propriedade abstrata dela: a possibilidade de vendê-la em certas condições. Marx também nomeia a primeira característica “estranhamento da coisa” e a segunda “ auto-estranhamento.”
A terceira característica diz respeito à alienação do homem com seu ser genérico. Este aspecto esta diretamente ligado, à idéia segundo a qual o objeto de trabalho é a objetivação da vida da espécie humana. Haja vista que o homem se duplica tanto enquanto consciência intelectual, como também enquanto efetivação. Completando-se, por isso, a si mesmo, num mundo criado por ele. Contudo, o trabalho alienado realiza no ser genérico do homem, um estranhamento, colocando-o perdido enquanto ser, sem sentido, maculando seu relacionamento interior e exterior. Esta é, portanto, a alienação do homem com a humanidade em geral, ou seja, ocorre aqui a alienação da “condição humana,” por meio do ato de produzir do capitalismo que conduz o homem ao rebaixamento, coisificando-o.
Na quarta característica o que está considerando-se é a relação do homem com outros homens. Como nos diz Marx:
“Uma conseqüência imediata da relação do homem a respeito do produto do seu trabalho, da sua vida genérica, é a alienação do homem relativamente homem. (...) De modo geral, a afirmação de que o homem se encontra alienado de sua vida genérica significa que o um homem está alienado dos outros, e que cada um dos outros se encontra igualmente alienado da vida humana. (Marx. 1993 p. 166)
(...) Assim, nesse contexto, a economia política liberal representa o ápice desse processo de desenvolvimento. Essa superioridade da economia política liberal que exacerba o excedente (mais-valia) é reconhecida por Marx nas seguintes questões.
1. Define o capital como trabalho armazenado.
2. Mostra que a acumulação do capital aumenta com divisão do trabalho e que a divisão do trabalho aumenta com a acumulação do capital.
3. Descreve de modo agudo e consistente embora unilateralmente a idéia de que o trabalho é a única essência da riqueza.
4. Acaba o misticismo da renda da terra.
5. Prova que o poder governante da sociedade moderna não é político mas econômico; o poder de comprar do capital, e finalmente;
6. Estabelece-se como única política e única universalidade tornando evidente seu próprio caráter cosmopolita.

SILVA. Ricardo G. A. A dialética do Senhor e do escravo no contexto da consciência de si e o mundo do trabalho. In. Reflexões sobre a fenomenologia do Espirito de Hegel. Editore UFC. Fortaleza.2008. p.81-90

10.12.2009

A questão da Liberdade em Hannha Arendt

Prof.Ms.Ricardo George

Hannah Arendt entende a liberdade como manifestação do homem no espaço público, mediado pela ação e pela linguagem. Política sem liberdade é uma compreensão distorcida de política, tanto quanto conceber liberdade sem política. Esse espaço público é o local onde uma significa a outra. Há nessas esferas uma co-originalidade, onde uma dá suporte a outra no tocante a seu significado. A isso Arendt chama atenção da seguinte forma:
“Para a pergunta sobre o sentido da política existe uma resposta tão simples e tão concludente em si que se poderia achar outras respostas dispensáveis por completo. Tal resposta seria: o sentido da política é a liberdade” (OP, p. 38).34
Não há como conceber a ação privada da liberdade, pois ela ganha força tanto quanto é livre para manifestar-se. É disto que é composto o espaço público: elementos plurais e livres. “A política baseia-se na pluralidade dos homens. Deus criou o homem, os homens são um produto humano mundano, e produto da natureza humana” (OP, p. 21). Nesse sentido, podemos afirmar que a política trata do convívio entre os diferentes, isto é, a pluralidade traz em si o sentido da liberdade, manifesta o direito de todos aparecerem e atuarem. A política é plural, porque a liberdade exige a pluralidade como condição sine qua non. Não há liberdade quando um só é dono da verdade e os outros não têm o direito de exprimir suas posições. Para Hannah Arendt, o campo da política é o campo de ação, que só é possível quando em uso da liberdade e não uma liberdade teórica, mas uma que aparece no mundo fenomênico. Sendo assim, o campo da política não é o da razão pura como queria Platão – nem o da razão prática – como aparentemente, segundo Arendt, se pensa que teria sido a posição de Kant, de tal modo que podemos afirmar que a política está em outro campo: o do pensamento plural.
“A liberdade, que encontra na pluralidade sua expressão, tem constituição no mundo político onde ocorrem os negócios humanos, de modo que uma liberdade apenas teórica não é capaz de habitar a ação, pois esta se dá no mundo fenomênico especialmente no seu “campo original, o âmbito da política” (EPF, p. 191).
Ao identificarmos o campo original da liberdade como sendo a política, o fazemos fundamentado no fato de que os homens vivem em um espaço público, que é político na sua constituição, já que não temos como conceber o espaço público sem a pluralidade, condição sine qua non para a liberdade, de tal modo que no espaço público se experimentam o discurso e a ação, e os mesmos só existem onde existir a liberdade. Disso concluímos que política e liberdade se auto-identificam, não podendo se conceber uma sem a outra, a não ser que admitamos o equívoco da tradição separando um do outro. Só nesse equívoco se poderia admitir a política como negadora do espaço público e, conseqüentemente, da pluralidade, da ação e do discurso; só assim poderíamos encontrar política e liberdade destoando. Fora disso uma identifica a outra, já que a política é o espaço acolhedor da liberdade, e a liberdade, seu sentido. Assim nos diz Hannah Arendt:
“O campo em que a liberdade sempre foi conhecida, não como um problema, é claro, mas como um fato da vida cotidiana, é o âmbito da política. E mesmo hoje em dia, quer o saibamos ou não, devemos ter sempre isso em mente, ao falarmos do problema da liberdade, o problema da política e o fato de o homem ser dotado de ação; pois ação e política, entre todas as capacidade e potencialidade da vida humana, são as únicas coisas que não poderíamos sequer conceber sem ao menos admitir a existência da liberdade” (EPF, p. 191).

Tudo isso fundamenta nossa afirmação de que a liberdade é o motivo que possibilita aos homens conviverem politicamente e sem a qual a vida política como tal seria destituída de significado: “a raison d’être da política é a liberdade e seu domínio de experiência é a ação” (EPF, p. 192).
A ação que expressa a liberdade é, para Hannah Arendt, aquela que traz em si a condição da pluralidade e a necessidade do espaço público para aparecer, é a ação que busca manifestar o outro. Nesse sentido, o mundo artificial tem de ser cenário da ação do discurso, sob pena de se perder o sentido da política e de a liberdade não ter realidade concreta. “Sem um âmbito público politicamente assegurado, falta a liberdade, o espaço concreto onde aparecer” (EPF, p. 195), de tal modo que, sem esse espaço, se pode encontrar a liberdade em qualquer outro lugar menos onde ela faz a diferença para o existir plural dos homens, menos onde ela pode significar suas ações e lhes garantir a possibilidade do novo. Sendo assim, encontraremos a liberdade nos pensamentos e produções teóricas ou nos corações, contudo, nem estes nem aquelas são capazes de manifestar aquilo que realmente importa no espaço público, os assuntos humanos fenomenicamente manifestados. Por fim, podemos concluir que ação, pluralidade e espaço público são categorias centrais para a compreensão dessa co-originalidade existente entre liberdade e política, sendo possível afirmar: “a liberdade como fato demonstrável e a política coincidem e são relacionadas uma à outra como dois lados da mesma matéria” (EPF, p.195).
Prof. Ms. Ricardo George
professor Assistente da UFRPE.